quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Semana 4


Ontem vi-te pela primeira vez desde que partiste.
Estavas perfeita!

 
E agora não digo mais nada porque está tudo dito.
Ora, quem disse que a poesia não podia ser simples?
Tu hoje és a poesia, a minha poesia.
Aqueles dois versos estão perfeitos assim, sem adereços ou ruído.
E acrescento, quando os escrevi,
Encostei-me na cadeira e foi como se tivesse lido
Os Lusíadas de uma só assentada, o meu coração fazia
Rimas com a minha mente, tão em sintonia estava eu com as palavras.
Fecho os olhos e imagino-te.
Sim, a poesia é simples!


sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Semana 3



Piscava. Eu juro que piscava!
E a sua luz era tão intensa
Que quando se apagava eu sentia
Que o chão me fugia e iniciava uma queda livre!
Isto apesar de estar um escuro cerrado
Que para além de mim - que curiosamente não via -
Só existia aquela luz vermelha intermitente.
Não , não me consigo mexer!
(E no escuro completo faz sentido?)
Apenas me irrita aquela coisa desafiante,
Que me controla e paralisa.
Quero alcança-la, comanda-la, tê-la
Uma possibilidade qualquer que me faça sentir menos perdido.
Mas eu sou a marioneta. Nada consigo fazer, sucumbo.

Piscava, piscava, com vigor!
Mas quanto mais a olho mais me parece um chamamento.
Não tanto pelo seu carácter ofuscante, mas pelo seu poder.
Cerro os dentes e, ai!, quando vou dar o primeiro passo
A luz apaga-se e desequilibro-me no vazio.
Volto onde estava… Onde? Não sei

Piscava, piscava.
E eu diria que a vejo como um desafio pueril.
Dou o primeiro passo destemido,
De frente, com os olhos de tal maneira temerários
Que os imagino duas luzes vermelhas quase de igual intensidade.
Fecho os olhos, concentro-me enquanto a luz não volta a acender,
E depois dou o meu segundo passo.
Terceiro. Quarto. Quinto…
Estou tão próximo que me dá um aperto no peito,
Um aperto benévolo e didáctico, ao lembrar-me da minha prostração
Perante este jogo de crianças.
Agora já sou eu que comando, as regras tornaram-se minhas.
Estou quase. Vou apanha-la… Caio como num desmaio

Sentado num pequeno muro, vejo à minha frente um pequeno lago,
Uma imagem bonita e familiar que me apazigua.
Quando me recosto sobre os braços,
Sinto imensas formigas a subirem pelo meu corpo,
Provocando-me cócegas e impressão.
Livro-me de algumas mas o resto pára no meu peito.
Começam a dizer: “Que bela cabeça que tem.
É enorme!” Diz outra: “E nós que sempre pensamos
Que os pés é que eram grandes
E que a cabeça, lá no alto, era pequenina!”
“É uma perspectiva interessante”, exclamei.

Pisco, pisco.
Envolto nos lençóis, vejo as horas. Adormeci.


PS. Isto tudo só para dizer
Que faltaste ao nosso encontro no mundo dos sonhos

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Semana 2


Os teus olhos amendoados, cor de azeitona,
Vivos e alegres, trespassam-me.
São tão sinceros que me deixam envergonhado.
Sim, é uma fotografia. E sim, fui eu que ta tirei.
Mas não consigo evitar corar

Lembraste os dias que ficámos só a olhar
Um para o outro, sem mover um milímetro que fosse,
Porque aquela forma de estar era a melhor do mundo?
Às vezes desviávamos o olhar e lembrávamo-nos que tínhamos fome
Para no segundo a seguir nos esquecermos completamente.
Creio que, sem dizer nada a ninguém,
Inventámos a nossa linguagem.
Nem um ao outro o confidenciámos por palavra.
Mas de vez em quando piscavas-me o olho
Em sinal de confirmação.

Havia alturas que nem precisava de te explicar
Já tu o compreendias
E eu sentia um abraço invisível
Que me levantava e repunha as energias.
Outras era eu que te percebia
E espontaneamente criava piadas, inventava maluquices
E não desistia até o teu olhar se iluminar.
Estou a usar o passado mas isto é presente e futuro!
Sabes que mais?
Tenho saudades de olhar para ti
E se estivesses aqui
Tenho a certeza que me piscavas o olho

Semana 1



Cheguei a casa.
Ainda cansado da noite mal dormida,
Enchi um copo de água e encostei-me à bancada.
Acabaste de apanhar o teu avião…
Estou sozinho na cozinha, de vista baça,
Inerte, sem expressão.
Gostava de ter dormido mais. A despedida
Foi tão rápida que mais pareceu um sonho.
Não terá sido?

Ao dar o último trago de água, levanto o olhar
E deparo-me com o grande relógio de ponteiros.
Como que por magia, moveu-se.
Desperto os sentidos e distingo o seu tic tac,
Constante e pesado, um ritmo virtual que parece tão meu agora.
Tic tac, tic tac
Espero que o ponteiro grande ande mais uma vez
Mas a espera parece interminável.
Desisto e bebo mais um copo de água,
Com o irresistível ah! que as crianças tanto adoram.
Tic tac, tic tac, tic tac
Ah!!
A respiração parece abrandar,
O olhar prende-se hipnotizado.
Tic tac, tic tac, tic tac
Parece definir a marcha da minha angústia crescente
Tic tac, tic tac, tic tac
Mudou!
Por momentos, deixo-me estar.
Como que a recuperar de uma brincadeira de mau gosto.
Nunca pensei que um minuto demorasse tanto!...
Solto um suspiro involuntário

Mecanicamente, ligo a televisão e sento-me.
Ainda assim, por uma vez, no meio da distracção,
Não pude deixar de ouvir o tic tac e sorrir.
O que vale é que este pobre diabo não pára,
E cada vez que anda é um tic tac a menos
Para a próxima vez que nos formos encontrar.

Mas não te preocupes
Não vou ficar a contá-los


PS. Recebi a tua mensagem a dizer que chegaste bem.

Semana 0

Pensei em escrever-te um poema
Mas um arco-íris inundou-me a mente,
Cegou-me com as suas cores brilhantes,
E o que eu queria escrever só senti!

Pensei em escrever-te uma quadra,
Daquelas pequenas e directas,
Que nada devem à simplicidade,
Mas imaginei o mar, sonhei voar, toquei o infinito
E apenas escrevi o teu nome.

Pensei, envergonhado, escrever-te apenas um verso.
Uma coisa qualquer sem grande nexo,
Que ao mesmo tempo fosse profundo e belo.
Mas, qual guerreiro vencido, apenas desenhei:
Gosto de ti!